

Por Isabel Fabris, Coordenadora de inglês da Escola Parque
Nestes tempos de pandemia foi-nos imposto o distanciamento social como forma de preservação da nossa saúde e segurança. E, assim, se, por um lado, nos vimos forçados à reclusão, por outro, fomos encorajados a buscar formas de nos mantermos atuantes. Na nossa vida pessoal e profissional muitos desafios nos foram impostos. Pouco a pouco construímos alternativas para darmos continuidade à vida. Essa maravilhosa capacidade humana foi colocada à prova, mais do que nunca. Porém, uma grande revolução, propiciada pela tecnologia, aconteceu. A conexão digital em tempo real nos possibilitou alternativas para o nosso cotidiano, de maneira nunca antes imaginada. Porém, nada disso teria sido possível sem o engajamento dos atores sociais.
Nas escolas o desafio foi posto. Compreendemos imediatamente a urgência de criarmos novas práticas nestes novos tempos. A tecnologia se apresenta como protagonista de uma grande transformação na educação; transformação essa que desafia tanto as instituições de ensino, quanto educadores, alunos e famílias. Porém, a tecnologia é uma ferramenta que não é um fim em si mesma. Ela depende da ação das pessoas sobre ela, de sua criatividade e inventividade. O que se passa, então, é surpreendente. Escolas, cujas propostas de ensino-aprendizagem são dinâmicas e provocadoras, fundamentadas na problematização, na experiência e na ética das relações humanas, tiveram como desafio traduzir sua filosofia de ensino para a linguagem virtual; uma questão bastante complexa e que exigiu uma enorme mobilização. O encontro presencial foi substituído pelo virtual, porém ao contrário de ser uma experiência congelada e replicada, por meio de recursos pré-existentes, as escolas Critique se dedicaram a construir o seu trabalho autoral. Equipes pedagógicas e professores passaram a esboçar diariamente seus planos, manejando recursos – ora reinventando-os, ora criando novos-, sem perder de vista a sua meta principal: a aprendizagem significativa, situada e crítica. Assim, de modo muito singular, criaram a aproximação necessária com os atores envolvidos, sem nunca deixar de lado o que as distingue: o seu endereçamento ao outro, o conhecimento, o questionamento, a criatividade, a emoção, a solidariedade e as singularidades.
Inicialmente, surtiram descrenças quanto à capacidade das escolas e educadores, de modo geral, se adaptarem à nova situação. Dizia-se: “a escola finge que ensina, os alunos fingem que aprendem”. E ainda, “ela não está apta a dar conta desse desafio, pois os professores precisam dominar habilidades para as quais não foram preparados”. De fato, não esperávamos por nada disso, mas quem disse que a arte do educador é apenas lidar com o previsível, reproduzir e replicar? Não seria a sua maior arte reinventar-se e desacomodar? O professor, águia com complexo de galinha, como provocou Rubem Alves, jamais se lançaria nesse voo. Porém, diante do desafio de subir a colina, de onde o que se vê é um panorama inusitado, nossos professores, águias, alçam novos voos, lado a lado, em revoada. E assim, tem sido, desde então, a nossa ação cotidiana: uma prática solidária e colaborativa, em que planos, projetos, recursos, ideias vão tecendo o nosso trabalho. Desse modo, a escola atravessa os seus muros e se faz presente nos lares.
E as famílias? Sabemos que a situação que vivemos demandou uma nova configuração do espaço familiar, antes essencialmente privado. As circunstâncias exigiram uma nova organização e delimitação de fronteiras, em um mesmo lócus. A sala de estar, a sala de jantar e o quarto passaram a ter outras funções, abrigando trabalho e educação. Como em uma peça de teatro, o cenário é alterado a cada cena. Assim, em um constante movimento de ensaio e erro, próprio de toda a experiência humana, a escola adentrou os lares dos educadores e das famílias cotidianamente. Nessa arena, familiares e alunos, inseguros ou reticentes, começaram a se organizar pouco a pouco nessa configuração do espaço familiar. Divididos entre múltiplas tarefas, os adultos precisaram criar um ambiente facilitador de aprendizagem, munindo as crianças e os jovens de recursos necessários para a realização desse evento: internet, computador, privacidade e compreensão das regras desse jogo. Com o tempo, novamente entre sucessos e insucessos, foi-se aprendendo a lidar com essa realidade e a tirar dela suas vantagens. O resultado foi o engajamento surpreendente das famílias.
Dentre dificuldades e acertos, prevaleceu o empenho de todos, com a certeza de que não existe nenhuma atividade social que seja apenas harmoniosa e bem-sucedida. Como disse o escritor mineiro, Graciliano Ramos, “A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta”. E, assim, neste momento, felizmente, contrariando algumas expectativas, provamos, escola e professores, sermos capazes de lidar com o enfrentamento de dilemas e a busca de soluções, juntamente com as famílias, sem as quais nada disso seria possível.
Por fim, sabemos que a educação não será mais a mesma, nem tampouco seremos nós, cidadãos. Frustramo-nos com projetos interrompidos. Sofremos as perdas de vidas e outras perdas vividas. Vivenciamos incertezas, inseguranças, experiências angustiantes e dolorosas, mas não estivemos e não estamos sós. Levantamo-nos todas as vezes com a certeza de que precisamos construir pontes. E, munidos de toda a força e energia necessárias, nos dedicamos, colaborativamente – famílias, alunos, escola e professores -, a levantar os pilares e a assentar o pavimento por onde devemos fazer as travessias, pois o enfrentamento, a busca e o entendimento são, com certeza, a nossa vocação.